segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Tempo de romper para fecundar - Esther Grossi

"Viver é processo permanente de mudança. É essencialmente inerente ao estar vivo a dimensão da transformação. Porém, segundo Piaget, em seu último livro intitulado "As formas elementares da dialética", as mudanças são de dois tipos, as quais ele denominou de discursivas e de dialéticas. Elas também podem ser caracterizadas como de acabamento ou estruturais. Isto é, há mudanças que se fazem a partir de bases estruturais já postas. E há mudanças em que o que se muda são as próprias estruturas.
Sempre é bem difícil assumir as exigências deste estado mudancial da existência. Fazemos de tudo para tentar assegurar a tranqüilidade do repetitivo e da ausência de surpresas, apostando na comodidade do já conhecido. Enfrentar o novo, até então ignorado, implica numa aptidão para a aventura e numa juventude de espírito que, às vezes, é ausente, até dos mais jovens fisicamente.
É difícil suportar as mudanças das fases discursivas mas, sobretudo, é difícil encarar as exigências das mudanças das fases dialéticas. Dar-se conta das insuficiências de um sistema estrutural é muito incômodo e ousado, porque significa Ter que desconstruir tudo o havia sido construído em cima dele.
A vivência destas fases também é prerrogativa das instituições. O GEEMPA viu-se mais uma vez confrontado com esta tremenda demanda de uma fase dialética. A demanda de romper para fecundar. Ela implica em honrar as necessidades do momento, as quais exigem não seguir apenas em cima do que já havia sido produzido a partir do construtivismo pós-piagetiano, mas sim, encaminhar novas elaborações. A diferença de uma proposta didático-pedagógica para produzir a alfabetização foi uma primeira conquista muitíssimo importante. Com ela é possível enfrentar com êxito o desafio dos baixíssimos índices de aprendizagem da leitura e da escrita no 1º ano do ensino fundamental, especialmente nas redes públicas educacionais. Entretanto, é muito necessário e urgente que algo semelhante se dê para as demais séries, a respeito das aprendizagens da língua, assim como para as aprendizagens nas demais disciplinas. Esta é a tarefa que se impõe o GEEMPA, neste momento: a da pesquisa grave e fecunda que resulte em propostas didático- pedagógicas construtivistas pós- piagetianas para todos os conteúdos de toda a escolaridade, sem o que não é legítimo falar-se de construtivismo nas escolas. E se for falado, temos que denunciar como indevido.
O construtivismo pós-piagetiano se caracteriza precipuamente pela compreensão de que aprende-se através de elaborações pessoais embebidas de viva interação sócio-cultural. Isto é, não se aprende diretamente pela captação da lógica dos conteúdos científicos, academicamente dispostos e expostos, mas de hipóteses fabulatórias que se geram do encontro de informações no dia-a-dia dos grupos humanos a respeito dos conhecimentos visados.
Em outras palavras, começa-se em geral, a aprender algo escolar, muito antes de termos um professor na nossa frente apresentando-nos achados acabados dos livros quer tópico de conteúdo escolar circulam informações via mídia ou via trocas societais que conduzem a hipóteses de interrelações entre elas eivadas de incompletudes e equívocos. Ignorá-las, impondo os conceitos científicos em seu acabamento final, é fadar o ensino ao fracasso que está sendo vivido no sistema escolar brasileiro, conforme dados de múltiplas avaliações.
Estas construções fabulatórias, etapas indispensáveis das trajetórias rumo aos conhecimentos, configuram a antropologia das aprendizagens que Ernani Fiori aponta como a principal contribuição paulofreiriana às questões da epistemologia.
Ensinar, portanto, consiste em aplicar estratégias que levem os alunos a passar de suas hipóteses menos elaboradas a outras melhor organizadas, que implicam numa dosagem de fornecimento de informações, a qual precisa ser presidida sabiamente, não pela lógica científica do conteúdo a ensinar, mas sim, pelo entrelaçamento entre esta e a lógica do processo sociopsicológico no qual está envolvido o aluno.
O desnudamento das características do processo "sui generis" da aprendizagem e dos mais varia dos campos conceituais dos currículos escolares é o objeto das pesquisas nas quais investe o GEEMPA neste dois últimos anos.
Debruçar-se neste afã, levou o GEEMPA a renunciar temporariamente suas atividades com as vanguardas pedagógicas e a renunciar também a múltiplos convites para palestras, assessorias e consultorias pelo Brasil afora. Mas isto não significa menor compromisso com professores e alunos. Muito pelo contrário, trata-se de assumi-lo seríssimamente na medida em que ele se aprofunda na pesquisa da sociopsicogênese da língua até a 5ª série e envereda também na mesma trilha na área dos estudos sociais e da matemática, com promissoras possibilidades de definição de novas contribuições às demandas dos professores, a braços com seu engajamento de fazer aprender, de verdade, a seus alunos.
É neste contexto que aparece o presente número da Revista do GEEMPA, apontando para novos rumos que resultam do laborsubterrâneo da investigação científica em que o GEEMPA está empenhadíssimo.
Ronai Rocha, José Luiz Caon, Maria Luiza Coelho e Ivete Keil, nos escrevem sobre suas reflexões brotadas no âmago de nossos encontros semanais em que se trocam hipóteses, elaborações, mas ,sobretudo, muitas perguntas.
Maria Júlia Canibal reafirma, com a história de Bruna, o centro dos achados contemporâneos sobre o aprender, de que "inteligência é processo e não dom" e de que "fica-se inteligente, aprendendo". Donde, segue-se a conseqüência de que "todos podem aprender".
Gérard Vergnaud aduba nossos intentos com o fecundíssimo conceito de campo conceitual e da formação de competências para o trabalho, em seus dois artigos neste número.
Cristóvam Buarque e Maria Rita Kehl nos abrem horizontes especiais mais amplos da ação docente, a saber, o horizonte de um projeto grande de sociedade e o do equacionamento de uma das mais necessárias bandeiras de luta dos democratas, hoje - o da justiça entre homens e mulheres.
E "nem tudo é invisível para os olhos" é uma concretização exitosa, em parte da rede pública, do que vem sendo elaborado no GEEMPA e no Projeto "Vira Brasília a Educação".
Que cada um dos leitores da Revista do GEEMPA seja um parceiro nesta caminhada rumo à redefinição da escola, a fim de que ela possa ser um dos espaços onde democracia se concretize, na oportunização de efetivas aprendizagens para todos."
Esther Pillar Grossi
(extraído do site do GEEMPA)

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GEEMPA na web

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Boa leitura!

UFMG, 15 de setembro de 2004

Governo do Piauí, 29 de janeiro de 2003

Correio Web, 21 de dezembro de 2001

Jornal do Brasil, 14 de maio de 2000